15 de junho de 2010

Interlagos!


Quem conhece o autódromo de Interlagos sabe que as coisas lá acontecem de um modo não muito normal. Agora, imaginem esse lugar que hoje em dia é inóspito nos idos dias da década de 1970.
Chegar lá já era uma aventura a parte. Morando na região central de São Paulo (Brás e Pari naquela época eram Zona Leste e hoje em dia essa região se expandiu e estes bairros estão próximos ao centro) e se escolhido fosse ir de ônibus, isso custaria ao menos um terço do seu valioso dia.
Bom, mas a verdadeira razão deste texto não é o caminho e a distância a ser vencida e sim a aventura que segue.
O Toninho, meu primo, é um aficionado por automobilismo e isso de certa forma me influenciou, pois somos muito próximos, creio que por conta da idade e da afinidade. Desde criança ele tem por hábito acompanhar a Fórmula 1 e sempre teve acesso a informações valiosas e não amplamente divulgadas (não me pergunte como). Muito provavelmente por seu irmão mais velho, o Marcos, que se envolveu em competições (amadoras) e participou de um meio recheado de figurões do ramo, do naipe de Camilo e Camilinho Cristópharo, Molinari, etc..

Sei que um dia ele me ligou e foi logo dizendo:
- Vai ter um teste do Coopersucar no sábado. Quer ir?
-Quem vai?
-Eu, você e o Paulinho (primo distante daqueles que encontramos em grandes festas, velórios e afins)
- Agente vai de ônibus?
- Acho que meu pai leva. (Ufa!)
- Tá bom.
Sábado 7:00 hs da manhã lá estava eu me achando preparado para enfrentar as desavenças climáticas que Interlagos proporciona. Eufórico para ver o teste do.....Coopersucar!?!?!? Que nada, o bom era passar um dia grandão ao lado do amadíssimo primo (amigo, irmão, confidente, parceiro, cúmplice,...).
Entrei no carro e pra lá seguimos. Caminho longo e diferente do trivial. Avenidas, marginais, ruas desertas, terrenos baldios, e tudo muito cinza, sempre foi essa minha sensação visual.
Chegamos. Fomos de encontro ao primeiro desafio: entrar no autódromo.
Depois de contarmos algumas histórias tristes e encenarmos alguns dramas baratos o segurança parrudão permitiu que entrássemos. Como de costume entramos calmamente e ao primeiro ruído de motor, saímos em disparada, ofegantes como fãs adolescentes em show do grande ídolo.
Chegamos na arquibancada, levamos “rápidos” quarenta minutos pra decidirmos em qual posição ficaríamos (lembrem-se: para assistir “um” carro de Fórmula 1 sendo testado). Lógico que quando estávamos bem acomodados e o carro já tendo passado por “inúmeras” 3 vezes em nossa fuça, CABRUM!!! Começa a chover. Corremos até a “Tribuna de Imprensa”, uma pequena parcela da arquibancada, com cobertura e cercada por uma mureta baixa. Não sei se este lugar ainda existe. Em dia normal de corrida realmente era reservado a imprensa, mas nesse dia o autódromo parecia estar reservado para nós 3 e a equipe do carro. Fez-se então um bom momento para um lanchinho. Tirei dois sanduiches magrinhos da minha sacola de sarja, daquelas que parecem um saco que quando se puxa um cordão acaba-se estrangulando a abertura. Comi como se não houvesse amanhã. Toninho puxou um maço de dinheiro do bolso e foi comprar um hambúrguer e uma “Crush”, suficiente pra dizimar a pequena quantia. Paulinho sacou de sua bolsa uma maçã e reservou um bolo Pullman, do qual se gabou:
- Rá! Agora só eu tenho o que comer mais tarde! Vocês estão na minha mão. (Ficamos esperançosos).
Volto agora a falar da lanchonete. Seria uma afronta à memória se não comentasseo cheiro de gordura que aquela “chiboca” emanava de suas entranhas chamadas de “cozinha”. Inconfundível.
Bem, estávamos lá na “Tribuna” esperando a chuva parar quando de longe avistamos um sujeito atravessar a tela de proteção da pista por um buraco generoso. Ele cruzou a pista, no início da reta de chegada, e seguiu tranquilamente para os boxes. Nós entreolhamos e sem emitir um som corremos para o tal buraco. Também cruzamos a pista (e isso já era bem emocionante) e em meio a uma avalanche de adrenalina tentamos caminhar o mais tranquilamente possível (com uma baita tremedeira nas pernas). Chegamos ao Box do Coopersucar. Primeiro nos escondemos e ficamos fitando o trabalho dos mecânicos, daí viramos cachorros em frente açougue quando avistamos Emerson e Wilsinho Fittipaldi e por fim chegamos ao clímax quando um dos mecânicos permitiu que entrássemos e encostássemos no carro. Tocamos a roda traseira do Coopersucar como os macacos naquela cena do Monolito no filme “2001 uma Odisséia no espaço”.
Após toda excitação, fomos gentilmente expulsos dali.
Voltamos extasiados para o lado dos simples mortais, a arquibancada. O Sol deu seu ar da graça. Assistimos as emocionantes sete voltas do Fórmula 1 brazuca e.....pronto, veio a chuva novamente. Corremos para nosso abrigo natural, a “Tribuna” e foi aí que o Paulinho, ao pular a mureta, meteu a testa numa viga de madeira da tosca cobertura. Num reflexo animal ele lançou sua bolsa certeiramente e com muita força na viga maldita e se você for lá em Interlagos, ainda hoje ouvirá o eco do grito gutural de dois adolescentes aterrorizados:
- O BOOOOOOLLLLOOOOOOOOOOO!!!!!!!!!!!!